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Por Filipe Charone Tavares Lopes

O exercício da empresa não é uma tarefa fácil. O empresário está sujeito a uma série de encargos e obrigações, das quais não poderá eximir-se, sob pena de execução dos bens sociais para o cumprimento dos compromissos assumidos.

 

Isto é o risco do empreendimento, algumas vezes tão elevado, que se não existissem meios para reduzi-lo, muitas atividades não seriam executáveis e muitos produtos ou serviços não estariam disponíveis ao grande mercado consumidor.

 

Alguns mecanismos criados pelo direito tentam reduzir este risco, facilitando o exercício da empresa e garantindo uma certa segurança aos empreendedores, que assim podem com maior segurança borbulhar suas mentes com novas ideias.

 

Um dos mais fundamentais exemplos de proteção é a criação de uma personalidade própria à pessoa jurídica constituída para o desenvolvimento da empresa, evitando que o patrimônio pessoal do empresário venha a ser responsabilizado pelas dívidas decorrentes da atividade explorada.

 

Ocorre que muitos enxergaram neste benefício uma janela aberta para a realização de fraudes contra seus credores, em prejuízo à economia geral.

 

Como regra, e com as atenções voltadas à tais fraudadores e aproveitadores, alguns casos existem em que tal personalidade poderá ser desconsiderada, evitando que a defesa se transforme em uma brecha para se eximirem indevidamente de dívidas existentes, o que prejudica toda a legitimidade do instituto. É o que se conhece por Desconsideração da Personalidade Jurídica.

 

Este instituto consiste na declaração de ineficácia de determinados atos, e não na nulidade da personalização, que continuará existindo até mesmo pelo Princípio da Continuidade da Empresa.  

 

Isso quer dizer que para a execução de determinada dívida, se ocorrer a desconsideração, não haverá eficácia a existência de tal personalidade em face ao referido credor, respondendo o patrimônio dos sócios por tais dívidas, como se deles fossem.

 

É uma forma que se mostrou suficiente, ou pelo menos muito efetiva para se coibir fraudes criadas por empresários inescrupulosos, que por sorte não representam a maioria dos grandes empreendedores.

 

Esta medida, por ser uma violação a uma teoria importante para a conservação das empresas, deveria ser aplicada como exceção ao caso concreto. Deveria ocorrer apenas quando houvesse a confusão patrimonial, desvio de finalidade ou mesmo fraude contra credores.

 

Apesar disto não é o que vem acontecendo. Na grande maioria dos casos a desconsideração se dá de forma automática e muitas vezes sem nem mesmo ser dado ao empresário o direito ao contraditório.

 

A doutrina e jurisprudência parecem ter voltado recentemente seus olhos para tais atos arbitrários, por meio da edição de decisões como a referente à Súmula n° 430 do STJ, que limita a responsabilização dos sócios apenas se agirem com abuso de poder ou violação do estatuto, aplicada para dívidas tributárias.

 

A legislação brasileira já vinha tratando sobre o tema em vários dispositivos legais, como se dá com o Art. 50 do Código Civil, que traça a regra geral atual no direito brasileiro, conforme segue transcrito:

 

“Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.”

 

Mesmo assim, ainda é comum ver juízes desconsiderando a personalidade das empresas de forma quase que automática, por vezes sem nem mesmo qualquer solicitação da parte contrária, o que é um absurdo, e merece ser combatido.

 

 A desconsideração não é a regra, ela é exceção, de outro modo de nada valem tantos estudos e técnicas voltadas a personalização de tais entidades. Pior, tamanha insegurança e risco nas atividades empresariais poderia por em risco todo o sistema econômico nacional com a redução dos empreendimentos.

 

Talvez faltasse no ordenamento jurídico um diploma processual suficiente para indicar ao magistrado o caminho correto a ser seguido. Que traçasse os ditames básicos ao instituto.

 

Esta situação pode ter seus dias contados, uma vez que está em curso no legislativo o Projeto de Lei n° 3.401/2008, que disciplina o procedimento para que haja a desconsideração da personalidade jurídica.

 

Cabe ressaltar que com a aprovação do aludido projeto, o descumprimento de seus ditames implicará inclusive em violação constitucional do Devido Processo Legal, sendo fundamento sólido para a defesa do empresário, que até a presente data mostra-se quase que de mãos atadas.

 

Apesar de estar voltado para o Direito Processual, com a regulação de mais um procedimento no processo, possui grandes impactos no Direito Empresarial, uma vez que mexe com ponto essencial na vida do empresário, que é o risco da atividade.

 

A primeira grande alteração trazida vem em seu Art. 4º, estipulando de forma expressa que o juiz não poderá decretá-la de ofício, valendo a pena a transcrição do dispositivo:

 

“Art. 4º O Juiz não poderá decretar de ofício a desconsideração da personalidade jurídica.”

 

Parece, a partir deste projeto, incoerente disposições em sentença que desde já determinem a desconsideração da personalidade jurídica como forma direta na fase de execução, afetando indiscriminadamente todos os sócios do empreendimento.

 

De fato, o procedimento para a desconsideração da personalidade jurídica será um incidente processual que deverá correr em autos apartados ao processo onde for solicitado, não podendo ser instaurado antes de ser dada a oportunidade à pessoa jurídica de satisfazer a obrigação ou de indicar os meios pelos quais será executada.

 

Para o início do referido procedimento, será necessária a solicitação efetuada pela parte interessada, normalmente o credor da dívida discutida perante o judiciário, ou pelo Ministério Público.

 

Com relação ao Ministério Público, sua participação será necessária para a regularidade do procedimento, pelo que vem exposto no Art. 5º do referido projeto, que apenas poderá ocorrer a desconsideração após ouvido o Ministério Público.

 

Não bastará, no entanto à pessoa legitimada efetuar o pedido ao juiz. Deverá de fato indicar quais os atos específicos praticados pelo sócio, membro, instituidor ou administrado que poderão ensejar à responsabilização.

 

Tais atos deverão ser adequados aos estabelecidos em legislação específica, não sendo considerado motivo para tanto a mera inexistência ou insuficiência de patrimônio, conforme expressamente dispõe o Art. 5º, §2º do referido projeto.

 

O novo regramento faz questão de estabelecer o conceito próprio dos atos reputados como fraude à execução, de modo a livrar de dúvidas a referida conceituação, o que faz em seu Art. 7º, abaixo transcrito:

 

“Art. 7º Considera-se em fraude à execução a alienação ou oneração de bens pessoais de membros, instituidores, sócios ou administradores da pessoa jurídica, capaz de reduzi-los à insolvência, quando, ao tempo da alienação ou oneração, tenham sido eles citados ou intimados da pendência de decisão acerca do pedido de desconsideração da personalidade jurídica, ou de responsabilização pessoal por dívidas da pessoa jurídica.”

 

 

Caso a parte não cumpra com a formalidade de indicar os atos praticados, o juiz de imediato deverá indeferir o pedido, extinguindo o incidente processual, seguindo a execução apenas contra a pessoa jurídica.

 

Se observado pelo interessado o procedimento acima abordado, indicando tais atos, o juiz não deferirá ainda a desconsideração, devendo dar aos interessados o direito de apresentarem uma defesa no prazo de 10 (dez) dias, podendo inclusive apresentar provas suficientes para afastar a desconsideração.

 

Esta é uma grande novidade. Trata-se de uma pura e devida aplicação do Princípio Constitucional do Contraditório e da Ampla Defesa, evitando a incômoda surpresa de o mero administrador, agindo dentro dos limites de seus atos ser vítima de uma execução da empresa que representa, num procedimento arcaico e medieval de expropriação de seu patrimônio.

 

Quando várias pessoas físicas forem atingidas pela desconsideração, os autos permanecerão em cartório, e o prazo de defesa contará da citação, quando não figurar a pessoa na lide desde o início, ou intimação, quando já a integrava.

 

Será assegurado às referidas pessoas obter cópias de todas as peças e documentos que solicitar dos autos, e juntar outros novos.

 

Vale destacar que mesmo existentes os motivos para a desconsideração, a mesma não se dará necessariamente de forma integral, afetando todos os sócios. Ela apenas afetará os que praticaram tais atos considerados abusivos, protegendo desta forma o sócio de boa-fé.

 

Não poderá a desconsideração ser baseada em analogia ou interpretação extensiva, devendo estar materializados os atos praticados e previstos em lei.

 

As referidas regras serão aplicáveis para decisões ou atos judiciais de quaisquer órgãos, sempre em casos de imputação de responsabilidade, em caráter subsidiário ou solidário, a membros, sócios, instituidores ou administradores por obrigações das pessoas jurídicas, e será aplicável a todos os processos em curso perante quaisquer órgãos do Poder Judiciário.

 

Esta inovação legislativa encontra-se atualmente aguardando designação de relator na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, pelo que ainda poderá ser alterada e mesmo não aprovada, mas merece desde já atenção pelas inovações justas a que vem aplicar.

 

Vale ressaltar que o instituto da personalidade jurídica precisa sim ser mantido e respeitado, sendo a sua desconsideração possível, mas nos casos estritos estabelecidos em lei, para evitar a ocorrência de fraudes ou injustiças.

 

Talvez falte ainda um diploma legislativo processual próprio para sanar o problema, sendo a aprovação deste projeto, se efetivada, uma possível e louvável saída.

 

Ademais, discussões surgirão advindas do referido projeto, principalmente no que se refere ao seu âmbito de aplicação, em especial na esfera trabalhista, ambiental e de consumo, que possuem aplicações específicas do instituto, mas a análise da melhor interpretação dependerá primeiramente da devida aprovação e sua conversão em lei.

 

Os empresários e os comercialistas de todo o Brasil aguardam ansiosamente. Acho que falo por todos!

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

 

REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 1º vol. 25ª ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003

 

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Por Filipe Charone Tavares Lopes

O início do exercício da empresa é sempre difícil. O empreendedor deve tomar uma série de decisões que vão influenciar diretamente nos resultados pretendidos. Deve-se considerar o peso da contratação do corpo de funcionários, a elevada incidência tributária e todos os demais riscos a que estará sujeito.
Uma das primeiras decisões deverá ser a forma que se desenvolverá a empresa, o que poderá dar-se por meio da criação de uma pessoa jurídica, em conformidade com o Art. 981 do Código Civil, em uma das muitas modalidades de sociedades existentes, as quais já são muito exploradas pelos doutrinadores, ou poderá exercer toda a atividade empresarial em seu próprio nome, como pessoa física, com fulcro no Art. 966 do mesmo diploma legal, quando se está falando no empresário individual, ou simplesmente empresário pela letra da lei.
Este pensamento é reforçado pelo ensinamento de FÁBIO ULHOA COELHO  ao expor o que se segue:

“Empresário é a pessoa que toma a iniciativa de organizar uma atividade econômica de produção ou circulação de bens ou serviços. Essa pessoa pode ser tanto a física, que emprega seu dinheiro e organiza a empresa individualmente, como a jurídica, nascida da união de esforços de seus integrantes.”
 
Ao contrário do que muitos imaginam, o empresário individual não é uma pessoa jurídica, mas sim a própria pessoa natural ou física do empresário no exercício da empresa, apesar de expedir praticamente toda a documentação requerida às sociedades empresárias, inclusive no que se refere ao CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas).
Em verdade tal fato se dá apenas para efeitos tributários, no que se refere ao recolhimento do Imposto de Renda, já que para fins tributários o empresário individual reputa-se como uma pessoa jurídica, conforme palavras de RUBENS REQUIÃO  abaixo transcritas:

“A transformação de firma individual em pessoa jurídica é uma ficção legal somente para o efeito do imposto de renda”

O empresário individual, para o início de suas atividades não se utiliza de um contrato social como se dá com as sociedades empresárias, mas sim de um simples registro efetuado perante a Junta Comercial, adquirindo um número de registro próprio, que é o que marca o início da legalização da empresa.
Na sua constituição, o empresário deverá adotar o nome empresarial da espécie firma para identificar a sua atuação no exercício da empresa. Tal firma terá por base necessariamente o nome civil do empresário, que poderá ser abreviado ou mesmo acrescido da menção da atividade exercida.
Um exemplo clássico seria o caso do nome João Paulo da Silva, que exercesse função ligada a confecções. Neste caso, poderia ser adotado tanto a firma João Paulo da Silva, quanto a sua abreviação J. P. da Silva. Do mesmo modo poderia acrescer a expressão Confecções para complementar o nome empresarial, resultando em J. P. da Silva Confecções.
Importante ressaltar que o nome do empresário, ainda que individual deverá atender aos princípios da Veracidade e da Novidade, constantes no Art. 34 da Lei n° 8934/94, que trata acerca do Registro Público de Empresas Mercantis e atividades afins.
No que se refere à veracidade, parece lógica a interpretação quando se possui a ciência da natureza de pessoa física do empresário individual, já que deverá refletir seu próprio nome civil.
Com relação à novidade, cabe ressaltar que em caso de homônimos, o primeiro a registrar o nome perante a Junta Comercial poderá impedir o uso da mesma firma por demais interessados, obrigado-os a adotar variações no nome que os diferenciem.
Vale ressaltar que não há o que se falar em personalidade jurídica própria para o empresário individual, diferente do que ocorre com relação às Sociedade Empresárias que como regra possuem personalidade jurídica distinta da de seus sócios.
O empresário individual, em decorrência disso, responderá pelas obrigações assumidas por meio de seus próprios bens. Da mesma forma não ocorrerá a dissolução da personalidade jurídica em processos de execução, uma vez que tal personalização não existe, podendo inclusive ser indicados bens pessoais do próprio empresário.
Tal entendimento vem esposado no posicionamento firmado perante os tribunais superiores, conforme jurisprudência abaixo transcrita:

“(…) Empresário individual é a própria pessoa física ou natural, respondendo os seus bens pelas obrigações que assumiu, quer civis quer comerciais. (…)” (STJ – RECURSO ESPECIAL: REsp 594832 RO 2003/0169231-3, Relator(a): Ministra NANCY ANDRIGHI, Julgamento: 28/06/2005, Órgão Julgador: T3 – TERCEIRA TURMA, Publicação: DJ 01/08/2005 p. 443, RSTJ vol. 200 p. 327)

“(…) O empresário individual, que é a própria pessoa física ou natural, responde com a totalidade de seus bens pelas dívidas contraídas uma vez que, com o registro na junta comercial competente, não adquire personalidade jurídica e somente é considerado pessoa jurídica para fins tributários. (…)” (TRF4 – APELAÇÃO CIVEL: AC 38 SC 2009.72.11.000038-7, Relator(a): SILVIA MARIA GONÇALVES GORAIEB, Julgamento: 15/12/2009, Órgão Julgador: TERCEIRA TURMA, Publicação: D.E. 20/01/2010)

Por tratar-se o empresário individual de Pessoa Física no exercício de atividade empresarial, e não de uma pessoa jurídica, salvo para efeitos tributários, deveria também ser legitimado a interpor ação perante Juizados Especiais Cíveis, mesmo quando não for qualificado como Microempresa ou Empresa de Pequeno Porte, já que não existe expressa proibição na Lei n° 9099/95. Apesar disto na grande maioria dos juizados os empresários individuais vem sendo impedidos de interpor ações, sendo tratados como se pessoas jurídicas o fossem.
O fato de o empresário optar pelo exercício da empresa de forma individual não impede que receba grande parte dos benefícios concedidos para as pessoas jurídicas, dentre os quais cabe ressaltar a opção pelo Simples Nacional, bastando que se enquadre nos requisitos constantes na Lei Complementar n° 123/06.
Apesar disso, o exercício da empresa de forma individual não implica necessariamente em tratar-se de Microempresa ou mesmo de Empresa de Pequeno Porte, já que o modo adotado na exploração da atividade não repercute de forma direta na renda auferida pelo empreendimento, apesar de a grande tendência ser a de adotar-se forma societária para atividades de maior vulto econômico.
Em verdade, atualmente o exercício da empresa de forma individual recebeu um auxílio na legalização de tais empreendedores com a edição da Lei Complementar n° 128/06, que deu origem ao MEI – micro-empresário individual, possibilitando a artesãos, ambulantes, barbeiros, entre outros, uma facilitação no registro e cumprimento de suas obrigações tributárias.
Tal diploma poderia ter agido de forma mais eficaz se fosse mais elevado o valor da renda bruta anual exigida para o enquadramento, que atualmente é de apenas R$ 36.000,00 (trinta e seis mil Reais), mesmo assim representou um bom auxílio para a legalização de tais empresas.
O empresário individual, ainda que pouco mencionado pela maior parte da doutrina, deve receber a devida atenção para que os operadores do direito saibam distingui-lo, bem como conceder-lhe todos os direitos que lhe são ressalvados pela lei, pois este tipo de empreendedor também gera tributos, empregos e progresso.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. Vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2003

MARTINS, Fran. Curso de Direito Comercial. Rev. Atual. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

OLIVEIRA, Celso Marcelo de. Tratado de Direito Empresarial Brasileiro. Campinas: LZN, 2004.

RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Curso de Direito Empresarial. 3ª Ed. Rev. Ampl. Atual. Salvador: JusPodivm, 2009

REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. Vol.1. São Paulo: Saraiva, 2003
 
WALDO, Fazzio Júnior. Manual de Direito Comercial. 3ª Ed. Atual. São Paulo: Atlas, 2003.

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